Engraçado! Há anos (uns 30 anos) retirei de uma estante de uma biblioteca um livro que descansava há 70 anos, em sua solidão, sem nenhuma visita. Uma solidão tão essencial quanto a minha. Eu não estava em nenhuma estante. Porém, jamais fui visitado e nada sei dizer sobre o mundo. Nada digo, por absoluta falta de palavras. Não as encontro nunca. Elas me parecem inadequadas. Assim, escrevo, por não saber dizer nada sobre as coisas.
Bem, o tal livro foi escrito por uma pessoa que ficou maravilhada com um diário. Um diário escrito por um náufrago de uma ilha perdida na imensidão do Pacífico. Se não fosse pela incapacidade de encontrar as palavras certas, eu também poderia escrever um diário, pois náufrago jamais deixei de ser. O náufrago, a princípio, vagou pela praia sem rumo ou propósito, com olhos apenas para a fímbria do horizonte, esperando por um barco salvador. De tanto andar de lado para o outro, acabou por perceber beleza nos grãos de areia e depois nas ondas do mar. Mais tarde, descobriu as belezas daquilo que, à primeira mão, não se vê: o que há abaixo da superfície da água. Não é possível reproduzir agora a beleza e suavidade da linguagem com a qual o autor descreve o fundo do mar, nem traduzir em palavras a enorme emoção que ele passa ao falar as pequenas e grandes criaturas que habitam as profundezas. Até hoje fico imaginado esse náufrago, que no silêncio de seus mergulhos, compôs uma grande e bela sinfonia de pequenas palavras e emoções e criou um livro. Nome do livro: O Aquário de Deus.
Quanto a mim, olho para o horizonte até hoje. Nenhum barco e nenhum aquário...
Belo texto.
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