Um galho seco estalou na tarde quente. O ar estava parado. Tudo tinha um certo ar de cansaço. O sol pintava as coisas com uma tinha hesitante naquele dia quente. Um vapor de brumas subia do chão inclemente. Pedras sem misericórdia pendiam das encostas. Uma mulher descia a colina, devagar e pensativa. Mas naquela hora nada havia para ser pensado. Só havia sentidos e calor. Pavor.
La na distância infinda do horizonte, um relâmpago incendeia o céu. A tarde não tardará a se transformar em noite. Tudo ficará coberto pela sombra rotunda da escuridão. Relâmpagos... De repente, a chuva desaba. Um vento frio envolve as coisas e a alma do vivente se sente aliviada e ao mesmo tempo atemorizada pela fúria da tempestade. Nesse momento mágico do auge da tormenta, tudo fica em suspenso. Todas as coisas tornam-se provisórias. A vida fica por um fio. Mas, aos poucos, a confiança vai voltando. A chuva vai ficando mais mansa. A fúria é acalmada. A árvore tombada testemunha a tormenta e todos testemunham a árvore caída, como um homem abatido ou um animal ferido de morte. Ela vai ficar ali. Em seus galhos, não haverá mais euforia de passaredos. Tudo ficou em silêncio. A árvore não é mais.
quarta-feira, 13 de abril de 2011
terça-feira, 12 de abril de 2011
Monstro?
Há algo de obscuro no fazer cotidiano de todos os homens. Maltratar um menino feio e tímido... Rir do aleijão alheio... Fazer gozação do tombo do outro.
Havia um homem que todos os dias fechava o pequeno portão de entrada de sua casa. E todos os dias alguém passava por ali e jogava o portão no chão. Mas todos os dias o homem fechava o portão. Antes, todos os dias, ele tinha de pegar o portão no chão, erguê-lo e colocá-lo no lugar. Dava trabalho, mas ao ver o pequeno portão no lugar, ele se sentia vingado e sereno. Foi assim durante anos. Mas sempre tem um dia que a rotina chega a um limite. O homem acordou com o barulho do portão ser jogado ao chão. Ele pensou: Nossa, não estão nem esperando mais eu sair de casa. Nesse dia ele ficou em casa. Nem se levantou. À tardinha, ergueu o pequeno portão e o colocou no lugar. Sentou-se ao lado do portão e se encostou no muro. Dormiu ali. Ou então, passou a noite acordado ali. De manhã, passou pela rua um rapaz assobiando. Parou em frente ao portão. Ficou ali um tempo e seguiu seu caminho. Meia hora depois, um vulto se aproximou do portão. Agarrou-o e jogou-o ao chão, com um estrondo. O homem se levantou e olhou para o vulto que hesitava entre correr e ficar ali, com ar de estúpido. Então ele reconheceu o seu vizinho de anos a fio. O homem estava com um revólver no bolso. Ele pegou o revólver. Olhou para o seu vizinho, estúpido, que mais parecia um rato que uma pessoa. Ele apontou a arma para o seu vizinho, que começou a tremer. Ele disse ao vizinho: Pegue o portão. O vizinho pegou. O homem disse: Agora ande e não olhe para trás. O vizinho bufava e seus passos faziam um barulho enorme no cascalho da rua. Os dois foram andando para a praia. Ao pisar na água, o vizinho balbuciou: Aqui tá bom? O homem levantou a voz: Não olhe para trás. Continue andando.
Os dois nunca mais foram vistos.
Havia um homem que todos os dias fechava o pequeno portão de entrada de sua casa. E todos os dias alguém passava por ali e jogava o portão no chão. Mas todos os dias o homem fechava o portão. Antes, todos os dias, ele tinha de pegar o portão no chão, erguê-lo e colocá-lo no lugar. Dava trabalho, mas ao ver o pequeno portão no lugar, ele se sentia vingado e sereno. Foi assim durante anos. Mas sempre tem um dia que a rotina chega a um limite. O homem acordou com o barulho do portão ser jogado ao chão. Ele pensou: Nossa, não estão nem esperando mais eu sair de casa. Nesse dia ele ficou em casa. Nem se levantou. À tardinha, ergueu o pequeno portão e o colocou no lugar. Sentou-se ao lado do portão e se encostou no muro. Dormiu ali. Ou então, passou a noite acordado ali. De manhã, passou pela rua um rapaz assobiando. Parou em frente ao portão. Ficou ali um tempo e seguiu seu caminho. Meia hora depois, um vulto se aproximou do portão. Agarrou-o e jogou-o ao chão, com um estrondo. O homem se levantou e olhou para o vulto que hesitava entre correr e ficar ali, com ar de estúpido. Então ele reconheceu o seu vizinho de anos a fio. O homem estava com um revólver no bolso. Ele pegou o revólver. Olhou para o seu vizinho, estúpido, que mais parecia um rato que uma pessoa. Ele apontou a arma para o seu vizinho, que começou a tremer. Ele disse ao vizinho: Pegue o portão. O vizinho pegou. O homem disse: Agora ande e não olhe para trás. O vizinho bufava e seus passos faziam um barulho enorme no cascalho da rua. Os dois foram andando para a praia. Ao pisar na água, o vizinho balbuciou: Aqui tá bom? O homem levantou a voz: Não olhe para trás. Continue andando.
Os dois nunca mais foram vistos.
domingo, 3 de abril de 2011
Uma tarde no hospital
Estava acompanhando uma pessoa na porta de um hospital em Belo Horizonte. Fiquei sabendo da seguinte história, que foi livremente contada no hall de entrada do hospital, por médicos, filhos do paciente e funcionários: um senhor de cerca de 70 anos foi internado para fazer um procedimento na bexiga. O paciente foi anestesiado e quando o médico ia iniciar o procedimento percebeu que o instrumento necessário e principal para tanto estava quebrado. Singelamente, o médico suspendeu o procedimento, chamou os filhos do paciente e lhes explicou que não seria possível fazer a cirurgia e que eles deveriam esperar que a anestesia passasse e levassem o paciente para casa.
Isso aconteceu assim e assim ficou. Eu vi o paciente ser levado para casa. É preciso perguntar: como acontecimentos como esse são possíveis? Como é que um paciente pode ser preparado para uma cirurgia sem que a estrutura do hospital esteja preparada para isso?
Estamos a anos luz do respeito à cidadania...
Isso aconteceu assim e assim ficou. Eu vi o paciente ser levado para casa. É preciso perguntar: como acontecimentos como esse são possíveis? Como é que um paciente pode ser preparado para uma cirurgia sem que a estrutura do hospital esteja preparada para isso?
Estamos a anos luz do respeito à cidadania...
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